quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Texto de apoio: REPRESENTAÇÕES DA LUTA E DA RESISTÊNCIA NEGRA NO QUILOMBO MANOEL CONGO NA LITERATURA DE CORDEL

http://www.uel.br/pos/letras/terraroxa/g_pdf/vol21/TRvol21h.pdf


REPRESENTAÇÕES DA LUTA E DA RESISTÊNCIA NEGRA NO QUILOMBO MANOEL CONGO NA LITERATURA DE CORDEL 

Patrícia Cristina de Aragão Araújo (UEPB) 
patriciacaa@yahoo.com 


RESUMO: A partir do texto poético de cordel, este artigo discute sobre a trajetória de luta e resistência de Manoel Congo, no Quilombo homônimo. Objetivamos refletir sobre quais as representações que tal acontecimento, importante na história dos quilombos no Brasil, adquire no texto de cordel e de que maneira essas representações podem ajudar na compreensão das questões relativas à forma como negros/as empreenderam suas lutas individuais e coletivas pela liberdade e em prol de seus direitos sociais. 
PALAVRAS-CHAVE: literatura de cordel; quilombo; representação; resistência.

UM POUCO DE HISTÓRIA: O Quilombo de Manoel Congo

UM POUCO DE HISTÓRIA: O Quilombo de Manoel Congo


Boletim Territórios Negros (v.4, n.16. 2004)
 
25/06/2013
Durante todo o período de vigência do regime escravista o município de Vassouras, localizado no Vale do Paraíba, no Estado do Rio de Janeiro, foi um dos maiores mercados de escravos da região. O grande número de escravos fazia com que os conflitos contra os senhores se desse sem tréguas. Na luta contra a escravidão, o quilombo de Manoel Congo, formado em 1838 em Paty do Alferes, antiga sede da vila, merece destaque.
Em 13 de novembro de 1838, na Fazenda Freguesia, de propriedade do capitão-mor Manoel Francisco Xavier, morria o africano Camilo Sapateiro, assassinado a pauladas. Outros escravos da fazenda previam que levariam a culpa do assassinato como forma dos senhores fugirem da responsabilidade moral, em um momento em que inúmeros enforcamentos estavam ocorrendo. Dessa forma, cerca de trezentos escravos, comandados pelo escravo Manoel Congo arrombaram as portas da Fazenda Maravilha, de propriedade do capitão-mor, roubaram mantimentos e vários outros objetos e depredaram a sede, revoltados contra o tronco, o trabalho forçado, a fom e e a miséria. Daí partiram para a Fazenda Santa Catarina, onde tentaram matar o capataz, que conseguiu fugir, e fugiram para uma densa mata para organizarem um quilombo.
Dias depois, os negros desceram da serra de Santa Catarina, incendiaram toda a Fazenda Maravilha e realizaram uma festa ao som de batuque, antes de voltarem para as matas. Revoltado, Manoel Francisco Xavier reuniu outros fazendeiros, também prejudicados com a fuga de escravos para o quilombo de Manoel Congo, e pediram ao governo a presença do exército. Sem conseguir o apoio pedido, os fazendeiros formaram uma expedição para destruir a organização dos escravos revoltados. No caminho pela mata esse exército de fazendeiros percebeu a existência de inúmeros ranchos, o que revelava que o quilombo era mais antigo do que se imaginava. Foram encontrados também dois acampamentos escravos nas trilhas por onde a expedição de fazendeiros caminhou por oito horas até encontrar os negros aquilombados. Depois de um intenso enfrentamento com armas de fogo, os homens de Manoel Congo venceram e fugiram dali.
Em 11 de dezembro de 1838 aconteceu o último e fatal ataque ao quilombo Manoel Congo, considerado o maior quilombo do Estado do Rio de Janeiro, segundo alguns pesquisadores. Manoel Congo e seus líderes foram presos e mantidos vivos para serem açoitados publicamente e enforcados legalmente. Manoel Congo respondeu a dois processos por crime de insurreição e homicídio e foi condenado à pena de morte em 06 de setembro de 1839; os outros líderes do movimento foram condenados a seiscentos e cinqüenta açoites cada um, dados a cinqüenta por dia , e a andarem três anos com gancho de ferro.

Para saber mais:
“O efêmero quilombo do Pati do Alferes, em 1838” de autoria de José Antonio S. Souza. Revista do IHGB, volume 295 abril/junho 1972. http://www.ipahb.com.br/manoelcongo.php http://www.patydoalferes.rj.gov.br/historia/congo.htm imagem de Manoel Congo retirada do site http://www.ipahb.com.br/manoelcongo.php 

Texto de apoio - Artigo "A literatura de Cordel e o ensino de história"

http://dspace.bc.uepb.edu.br/jspui/handle/123456789/3100

Título: A literatura de cordel e o ensino de História
Autor(es): Oliveira, João Batista Neves de
Palavras-chave: Cordel
Literatura Popular
Metodologia de Ensino
Ensino de História
Data do documento: 17-Mar-2014
Resumo: Este artigo é resultado da nossa vivência em sala de aula cuja preocupação central é compreender a dimensão educativa dos folhetos de cordel no cotidiano e na cultura popular. O cordel é tomado como um conteúdo de aprendizagem, revelando-se um importante recurso didático-pedagógico a ser utilizado na sala de aula, nas disciplinas escolares, particularmente na disciplina de História. A hipótese norteadora do estudo é que o conteúdo que permeia os cordéis permite a construção de concepções sobre o Nordeste, o diálogo de saberes e de percepções acerca do seu cotidiano e de sua cultura. Partimos do pressuposto de que o poeta de cordel é um educador, cuja prática pedagógica se expressa através dos cordéis, que são construídos a partir das experiências culturais e cotidianas, da concepção de ser humano e da realidade social que ele representa e elabora nos folhetos. Os resultados permitiram concluir que o cordel é uma forma de produção de conhecimento, cuja proposta pedagógica vem do cotidiano, enriquecendo o processo educativo, possibilitando a interação de múltiplos saberes e apresenta temas importantes que devem ser inseridos no conteúdo programático das disciplinas trabalhadas com os educandos em sala de aula e com a comunidade nas ruas e vivências cotidianas.
Descrição: Oliveira, J. B. N. de. A literatura de cordel e o ensino de História. 2012. 23f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História)- Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, 2012.
URI: http://dspace.bc.uepb.edu.br:8080/xmlui/handle/123456789/3100
Aparece nas coleções:29 - TCC

Quilombo de Manoel Congo

Quilombo de Manoel Congo

O Quilombo de Manoel Congo foi mais um dos episódios da luta dos africanos contra a escravidão que se notabilizaram pela preocupação suscitada nos escravistas.

Quilombo de Manoel Congo 
Aquarela Açoitamento de escravos na Ponta do Calabouço, de Augustus Earle (1793-1838), retratando as punições aos escravos no Brasil

Durante a década de 1830, a economia cafeeira começou a despontar no Brasil Império, principalmente na região fluminense do Vale do rio Paraíba. A afluência de escravos para as fazendas da região aumentou, sendo ainda intensificada a exploração do trabalho. No contexto de início da produção cafeeira, estourou mais uma revolta de escravos, que se consubstanciou na tentativa de formação do que ficou conhecido como Quilombo de Manoel Congo.
É indicado como uma tentativa em decorrência da efemeridade do Quilombo de Manoel Congo, situado no município de Vassouras no Rio de Janeiro. Porém, o medo suscitado nos latifundiários da região manteve viva a memória dessa luta dos escravos, conhecida também como Revolta de Paty dos Alferes.
A revolta ocorreu em novembro de 1838 entre os escravos do capitão-mor Manuel Francisco Xavier, que detinha algumas fazendas na região. O motivo do levante contra o fazendeiro teria tido origem após a morte do escravo Camilo Sapateiro pelo capataz de uma de suas fazendas. Indignados com o assassinato do companheiro de cativeiro, os escravos liderados pelo também escravo e ferreiro Manoel Congo resolveram protestar junto ao latifundiário, que prometeu tomar providências. Porém, essas providências nunca foram colocadas em prática.
O não cumprimento da promessa deixou ainda mais indignados os escravos. O assassinato de Camilo era um excesso brutal dos hábitos disciplinares de trabalho na fazenda. Como o senhor não tomou providências, os escravos mataram o capataz. Após essa ação, os escravos fugiram. A fuga em massa de cerca de 200 escravos ocorreu em duas fazendas do capitão-mor, entre os dias 06 e 10 de novembro de 1838.
Nas matas da região, liderados por Manoel Congo, os escravos iniciaram a constituição de um quilombo. Com as ferramentas e armas saqueadas das fazendas de Manuel Francisco Xavier, os escravos africanos e nascidos no Brasil pretendiam iniciar as lavouras para sua subsistência e garantir sua defesa.
O cordelista Medeiros Braga, em trecho de seu cordel O Quilombo Manoel Congo, a saga de um guerreiro, representou da seguinte forma a ação:
Manoel Congo com cuidado
Muitos escravos juntou,
Recolhidas várias armas
Mantimento e cobertor,
Passaram, seguindo a trilha,
Na Fazenda Maravilha
E já outros libertou.
Entretanto, a experiência não duraria muito tempo. Preocupados com essa ação em massa dos escravos, as autoridades da região resolveram pedir o apoio da Guarda Nacional para caçar os fugitivos. As forças militares foram lideradas por Luís Alves de Lima e Silva, o futuro Duque de Caxias, que em 11 de novembro conseguiu capturar a maioria dos escravos, sendo que alguns foram mortos.
Eles foram julgados pela fuga de 16 escravos. Quase todos foram condenados a 650 chibatadas, sendo aplicadas 50 por dia, para que não morressem durante o castigo. Tal situação poderia causar um prejuízo ainda maior ao proprietário dos escravos. Esses escravos foram ainda obrigados a utilizar um gonzo de ferro no pescoço por três anos.
Porém, era necessária ainda uma punição exemplar para inibir novas fugas em massa. Indicado como liderança da rebelião, Manoel Congo foi condenado à forca, em 1839. A sentença foi cumprida no Largo da Forca, sendo que Manoel Congo não teria direito a enterro. Receosos de novas fugas, os latifundiários da região criaram ainda uma cartilha para orientar os fazendeiros e evitar que episódios como o ocorrido na freguesia de Paty dos Alferes se repetissem. O Quilombo de Manoel Congo era a evidência de que os escravos continuariam sua luta contra a escravidão.
https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiadobrasil/quilombo-manoel-congo.htm.

Texto: Revolta de Manoel Congo em Paty dos Alferes

Revolta de Manoel Congo em Paty dos Alferes

Ocorrida durante o surgimento da cafeicultura no Vale do Paraíba, a Revolta de Manoel Congo resultou em fugas em massa de escravos e na efêmera constituição de um quilombo.
Capa do livro O Quilombo de Manoel Congo, publicado em 1935.
Capa do livro O Quilombo de Manoel Congo, publicado em 1935.
E Camilo sapateiro,
O escravo apaixonado
Quando ia pra fazenda
Visitar seu amor dado
Pelo cruel capataz
Foi brutal assassinado.
Sentiu, então, Manoel Congo
Muita gota a se somar
Sendo essa a gota d’água
Que chegou a transbordar
O delito rude, insano,
Levou o escravo africano
Com isso, a se rebelar.
O trecho acima é do cordel Quilombo Manoel Congo, a saga de um guerreiro, de Medeiros Braga. Nele é possível perceber os motivos que levaram os escravos das fazendas do capitão-mor Francisco Manuel Xavier, na freguesia de Paty dos Alferes, município de Vassouras, província do Rio de Janeiro, a realizarem a ação conhecida como Revolta de Manoel Congo, ocorrida em 1838. Os castigos e maus-tratos, além da morte de alguns escravos, pareciam ser uma constante nas fazendas do capitão-mor. O assassinato do escravo Camilo Sapateiro foi o estopim para a eclosão da revolta.
A região de Paty dos Alferes estava em ascensão econômica com o crescimento da cafeicultura no Vale do Paraíba Fluminense. Milhares de escravos afluíam às fazendas da região para trabalhar na lavoura do produto de exportação que garantiria a sustentação econômica do Império brasileiro.
Manoel Congo era um desses escravos. Seu nome provavelmente indicava a região do continente africano da qual era proveniente. A função de ferreiro exercida na fazenda do capitão-mor mostrava que tinha uma qualificação maior de trabalho, o que provavelmente garantia a ele condições menos piores de trabalho. Na mesma situação poderia estar Camilo Sapateiro.
A morte desse último levou os escravos a procurarem seu senhor para que tomasse providências contra o capataz. O capitão-mor Francisco Manuel Xavier afirmou positivamente que atenderia a reivindicação dos escravos. Mas não cumpriu com sua palavra. Diante da situação, os escravos resolveram matar o capataz e entre  os  dias  06  e  10  de  novembro  empreenderam  uma série  de fugas das fazendas de Francisco Manuel Xavier.

Após a morte do capataz, cerca de duzentos escravos fugiram das fazendas do capitão-mor e refugiaram-se na floresta de Santa Catarina, região próxima às fazendas. Na fuga, os escravos saquearam as instalações da propriedade, levando instrumentos e ferramentas de trabalho, além de algumas armas.
Esses utensílios serviram para iniciar a constituição de um quilombo, que ficou conhecido como Quilombo Manoel Congo. Vários escravos das fazendas da região fugiram para o local. Mas a experiência durou poucos dias. Em 11 de novembro, uma força militar da Guarda Nacional foi chamada à região para cumprir uma de suas funções: a de capitão do mato. O líder da Guarda Nacional era Luís Alves de Lima e Silva, o futuro duque de Caxias, que seria mais tarde patrono do exército, títulos conseguidos muito em decorrência da repressão a diversas rebeliões populares que ocorreram durante o Império.
Os escravos não conseguiram resistir por muito tempo. Alguns foram mortos pelas tropas, outros tantos foram recapturados e devolvidos a seus donos. Cerca de 16 escravos foram levados a julgamento pela participação na Revolta de Manoel Congo. Foram sentenciados a 650 chibatadas, distribuídas ao longo dos dias para evitar a morte. Além disso, foram obrigados a utilizar gonzos de ferro nos pescoços durante três anos.
A mesma sentença não foi aplicada a Manoel Congo. Era necessário punir exemplarmente o líder da revolta para evitar que novas fugas em massa de escravos ocorressem, colocando em risco a ordem escravocrata. Manoel Congo foi condenado à morte por enforcamento, sem direito a ter seu corpo enterrado, fato ocorrido em 1839.
A Revolta de Manoel Congo e sua repressão inseriram-se em um contexto de forte instabilidade política do Império. Durante o Período Regencial, várias rebeliões e revoltas eclodiram em território nacional, colocando em perigo sua unidade. Além da Revolta de Manoel Congo, a Balaiada e a Cabanagem, no norte do Império, também tiveram um caráter popular e, por isso, foram duramente reprimidas pelas forças militares controladas pela elite latifundiária.

Vídeo aula - https://www.youtube.com/watch?v=3Mcs6Ueji5o

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Durante a escravidão no Brasil, muitas vezes os escravos negros não suportaram calados os maus tratos e as condições horríveis a que eram submetidos. Nesta aula ...
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Vídeo aula - https://www.youtube.com/watch?v=4KB40-6yIko

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Texto: O Quilombo, Manuel Congo.


O QUILOMBO
MANOEL CONGO

“Não adianta os martírios
Que impõe o dominador,
O mundo muda mais rápido
Nos sentimentos de dor...
Um dia, decerto, um dia
Há de surgir a utopia
Que Manoel Congo sonhou.”

Para ter sob controle
O poder firme, constante,
Em qualquer país ou época
E de forma alienante,
Quem escreve sua história
Sempre tão contraditória
É a classe dominante.

Está nos livros didáticos,
Nos romances, na poesia,
Nos jornais, revistas, rádios,
Nas tevês, por todo dia
O clarão dos seus farois
A mostrar falsos herois
Que serviram à tirania.

A história verdadeira
De Canudos, Caldeirão,
De Zumbi, de Contestado,
Pau de Colher, essa então...
Quando não foi deturpada
Foi às pressas empurrada
Pra baixo do tapetão.

É grande o descaramento
Do seu historiador
Ao mostrar a independência
E aquele imperador
Cheio de pompa e heroismo,
Quando não passa, em cinismo,
De golpista e de opressor.

Independência queria
Com república, muito jus,
O nosso povo ao clamar
Sob o peso de uma cruz
Seu ideal verdadeiro
Dum brasí bem brasilêro
Como disse Zé da Luz.

Como poeta do povo
Em não posso me calar,
Da caneta faço espada
E parando pra pensar
Vou correndo pra compor
Para o tempo recompor
Que vivi a ignorar.

Manoel Congo é o primeiro
No tapete a se mexer,
A sua insatisfação
Dava bem pra perceber,
Sendo da África arrancado
Se mostrou inconformado
Com as elites do poder.

Consciente da injustiça
Por viver na escravidão,
Conhecendo a violência
Do chicote e do grilhão,
Para a revolta esperada
Tinha a luta sustentada
Na sua insatisfação.

Exercia Manoel Congo
O ofício de ferreiro,
Era menos maltratado
Pelo senhor fazendeiro,
Mas, nem por isso, deixou
De levar a sua dor
Às vítimas do cativeiro.

Na África livre, e hoje
Entre a senzala e a morte,
Manoel Congo sofria
Essa mudança de sorte...
Mais, ainda, em hora dada
Quando era acompanhada
De canga, tronco e chicote.

Para os escravocratas
Era aquilo natural,
Para eles, os escravos
Já nasceram para o mal,
Mas, não eles...por mandar,
Nasceram pra desfrutar
O poder e o capital.

A igreja tudo via
Mas, indiferente à dor
Fazia como o ditado:
“Ouvidos de mercador”,
E entre risos e prantos
Ficava com os encantos
Das moedas do opressor.

Por isso que Castro Alves
Desejou do fato atroz
Ter um raio em cada verso
Pra na fronte do algoz
Deixar marcada a maldade
Pela frase, com vontade,
De “Maldição Sobre Vós”.

Também se deu esse clima
Na região de Vassouras,
Lá no Rio de Janeiro
De terras tão promissoras
Onde, tirados dos lares,
Os escravos aos milhares
Foram postos nas lavouras.

Em Paty do Alferes-Vassouras
Havia um escravocrata
Dono de várias fazendas
Com muita lavoura e mata,
Era Manoel Xavier
E por ter muito café
Fazia parte da nata.

Tinha Manoel Xavier
Mais de trezentos escravos
Entre eles Manoel Congo,
Dos africanos mais bravos,
Que embora agrado houvesse
Não fazia qualquer prece,
Não aceitava conchavos.

A pujança do café
Atingia a região,
Ia aos pouco se formando
Dessa cultura o barão,
Sua produtividade,
Seu café de qualidade
Engrandecia a nação.

No entanto, esse eldorado
Não nascia, assim, com graça,
Vinha cheio de sujeira,
De injustiça e desgraça;
Chegou, sim, meio ao tormento
A custo do sofrimento
E humilhação de uma raça.

A riqueza parecia,
Pela desumanidade,
Justificar todos crimes
De uma tal sociedade
Totalmente, desregrada
Que tinha como sagrada
Tão-só a prosperidade.

Pelo seu escravocrata
Que no lucro tinha fé,
O Brasil passava a ser
O país que mais até,
Sem o senso de razão,
Importava a escravidão
Para exportar o café.

Traficantes de escravos,
Por dinheiro, tresloucados,
O imenso continente
Invadiam bem armados
E transformavam, insanos,
Os guerreiros africanos
Em valores de mercado.

Com a febre do café
Na região de Vassouras
Era a mão de obra posta
A serviço das lavouras
E, assim, com avareza,
Se incrementava a riqueza
Das classes possuidoras.

Postos em navios negreiros
Só com direito a penar,
Era tanto o sofrimento
Que aqui vale lembrar:
Mais da metade morria
Somente na travessia
Que se fazia do mar.

Entre seus sobreviventes,
Vassouras mais empregava,
Principalmente, Paty
Do Alferes, que ficava,
Por conta desse tesouro,
Como o grande escoadouro
Dessa mão de obra escrava.

De vinte mil habitantes
Que havia ali, então,
Quatorze mil eram parte
Da cruel escravidão;
Dos que perderam seus ares,
A liberdade, seus lares,
Esperanças e razão.

O capitão-mor Manoel
Xavier, o fazendeiro
Dono de léguas de terra
Da baixada ao tabuleiro
Reprimia seus escravos
Com dobrados desagravos
De jagunço e pistoleiro.

Era comum o mal uso
Da chibata e do grilhão,
Da prisão no tronco e canga
Que levava à exaustão;
Da arma própria de corte,
Da pancada até a morte
Que servisse de lição.

Certa vez um alforriado
Denunciou a um juiz
De cinco escravos que foram
Mortos como o dono quis,
Depois em vala lançados
Foram todos enterrados
Pelos seus jagunços vis.

O juiz investigou
Foi o fato constatado,
Mas, os jurados acharam
Que o prejuízo dado
Para o seu proprietário
Já era, em si, um calvário
Sendo, então, justificado.

D’outra feita um capataz
Sem ter a menor razão
Um escravo assassinou,
Pôs de um tiro no chão
Porque a vítima se ia
Sem ter carta de alforria,
Sem ter qualquer permissão.

Também, lá na Maravilha
Dos escravos, outro havia
Gostado de uma escrava
Da Fazenda Freguesia,
Porém, na escravatura
Esse tipo de aventura
Sua lei não permitia.

Cabia ao escravocrata
A escolha dos casais
Para que filhos nascessem
Das relações sexuais,
Sadios, fortes, dispostos
Quando assumissem seus postos
Na luta dos cafezais.

E Camilo Sapateiro,
O escravo apaixonado
Quando ia pra fazenda
Visitar seu amor dado,
Ele que queria a paz
Pelo cruel capataz
Foi brutal assassinado.

Sentiu, então, Manoel Congo
Muita gota a se somar,
Sendo essa a gota dágua
Que chegou a transbordar,
O delito rude, insano,
Levou o escravo africano,
Com isso, a se rebelar.

Porém, o líder marcado
Por sobrenome da terra
Na qual nasceu homem livre
A correr livre na serra,
Com paciência que tinha
Preparando-se já vinha
Para tal futura guerra.

Esse frio assassinato
Seguido sem punição
Levou a todos revolta
E foi tanta a reação
Que tentaram logo mais
Linchar o vil capataz
Sendo impedidos, então.

Mas, à noite os escravos
Da Fazenda Freguesia
Já haviam decidido
A fugir em romaria,
Sair com fé e vontade
Em busca da liberdade
Que sonhavam todo dia.

Foram as portas da senzala,
Que estavam de cadeado,
Arrombadas, prontamente,
E até as do sobrado...
E em cenas tão poéticas
Todas escravas domésticas
Fugiam para o gramado.

Pelas janelas desciam
Dispostas, encorajadas,
Porém, como eram altas
Puseram várias escadas
E de súbito, no final,
Da Casa Grande, em geral
Foram todas libertadas.

Houve ainda reação
Tendo morrido um feitor,
Um capataz assustado
Em escapar procurou
E parecendo ter asa
Voou pra cima da casa
E quietinho lá ficou.

Manoel Congo com cuidado
Muitos escravos juntou,
Recolhidas várias armas,
Mantimento e cobertor,
Passaram, seguindo a trilha,
Na Fazenda Maravilha
E já outros libertou.

Sempre munidos de armas
De fogo e de munição,
De machado, roçadeira,
Peixeira, foice e facão,
Seguiram todos em frente
Como buscando, evidente,
A terra da promissão.

Outros escravos sabendo
D’outras fazendas fugiam,
Pegavam mulher e filhos
E o mesmo rumo seguiam...
Era tão grande a vontade
De viver em liberdade
Que de nada eles temiam.

Alcançaram a floresta
Lá de Santa Catarina,
Na Serra Estrela, dali,
Como cumprindo uma sina,
Seguiriam pra Taquara,
Local que teriam para
Um quilombo na surdina.

Manoel Congo, a essa altura
Como rei foi coroado
E Marianna Crioula
Rainha de muito agrado,
Ela que dizia à classe:
“Morrer, sim; nunca entregar-se”
Para ser escravizado.

Já sabendo Manoel Congo
Quanto difícil seria
Manter um quilombo livre
Dos golpes da tirania,
Ele, então, mobilizava
Atrair mais gente escrava
Para a nova moradia.

Todas as noites saiam
E invadiam fazendas,
Libertavam seus irmãos
E armas para a contenda,
Era tão grande o sucesso
Da empreita com excesso
Que eles viam como prenda.

Vendo o quilombo a crescer,
Bem como, se organizar,
Começaram os fazendeiros
Logo a se mobilizar
E cobraram com urgência
Do poder a providência
Pra tudo recuperar.

“Quilombo de Manoel Congo”
É como eles chamavam,
Com cerca de quatrocentos
Ex-escravos já contava,
E a tendência exemplar
D’outros quilombos criar
Pelo que se propagava.

O poder preocupado
Com os fatos corriqueiros
Tomou suas providências,
Atendeu os fazendeiros,
Numa medida de urgência
Tomou toda providência,
Acudiu o desespero.

E um batalhão de soldados
No total cento e sessenta
Com a ordem de usar
A forma mais truculenta
Com ações mais repressoras,
Partia para Vassouras
Cheia de orgulho e opulenta.

Ali foram recebidos
Por fazendeiro e barão
Do café e do açúcar
Com a devida louvação
Pois, lá se priorizava
Essa mão de obra escrava
Pra manter a produção.

Então, todo aquele exército
Numa missão assassina
Sob aplausos e discursos
Da burguesia ferina
Partia como em festa
Para a vistosa floresta
Lá de Santa Catarina.

Aguardavam os quilombolas
Esses soldados do mal
Pra na “guerra de guerrilha”
Em uma luta desigual
Enfrentar e até vencer
Todo aparato, o poder,
Da Guarda Nacional.

Esta, já perto, só via
Muita casa abandonada,
Mais na frente escutavam
Barulho de machadada,
E pensando com esperteza
Em pegá-los de surpresa,
Foram seguindo a estrada.

Tanto a casa abandonada
Como o machado zunindo
Eram uma estratégia
Do quilombola fingindo
Estar com medo a fugir,
Ou um trabalho a cumprir
Para, na isca, atraindo.

Seguindo as trilhas abertas
Por quilombolas, então,
Não percebiam a porta
Levantada do alçapão
E com seu ar opressor
Partiam pra recompor
As perdas da escravidão.

Ao chegarem num local
Propício para emboscada
Os quilombolas surgiram
E numa brusca tacada
De tiro, foice e facão,
Atacaram o batalhão
Que bateu em retirada.

Mas, antes vários soldados
Tombaram ali pelo chão,
Muitos outros desertaram
O seu próprio batalhão,
Assim, vibrou toda classe
Como se consolidasse
Tal, qual, a libertação.

Manoel Congo teve à frente
De todo seu movimento,
Foi, inclusive, o primeiro
A usar do armamento,
E enquanto ele lutava,
Atirava e orientava
Do grupo o procedimento.

De batalha já vencida
Tratou, pois, de reunir
O quilombola e alertar
Do que estava por vir,
Perante a aristocracia
Controlava a euforia
Dos quilombolas dali.

Toda classe dominante
Já vinha de prontidão,
Tinha medo da revolta
Das vítimas da escravidão,
Para tal se preparava
Ante a insurreição escrava
Prevista na região.

Da Bahia conhecia
A revolta dos malês,
O voraz Lucas da Feira
A vingança e malvadez,
E a Revolta da Carranca
Onde muita gente branca
Pagou pela mesquinhez.

Também, os brancos temiam
Uma tal conspiração
De matar todos aqueles
Algozes da escravidão
E usar, bem à vontade,
Esposa e propriedade
Com a mesma humilhação.

Um jogo de vida e morte
O escravocrata implantou,
O combate aos insurretos
Só se dava com terror,
Quando não morte matada,
Consistia em chicotada
Por ordens do seu senhor.

O avanço da rebeldia
Visto como um impropério,
E o ataque frustrado
Que se deu sem ter critério,
Na visão dos seus olheiros,
Mexiam com os fazendeiros
E ameaçavam o império.

Em quatorze de novembro
Do ano mil e oitocentos
E trinta e oito, o governo
Imperial, truculento,
Enviaria, brutal,
Sua Guarda Nacional
Com poderoso armamento.

Esse exército comandava
Com grande selvageria
Luiz Alves Lima e Silva
Que bem mais tarde teria,
Por massacres, com rigor, 
O título compensador
De o “Duque de Caxias”.

     Ele chegando em Vassouras
Juntou-se à guarda local,
Capatazes das fazendas,
Jagunços do cafezal,
Indo dali ao quilombo
Para promover o tombo
Do quilombola, afinal.

Ali chegando cercaram
Com tal força desmedida,
Mas, ainda os quilombolas
Resistiram à investida,
Até que sem munição,
Só de foice e de facão,
Já não viam mais saída.

A Rainha Damiana
Crioula, no louco enlace
Lutava de todas formas,
Com tudo que encontrasse,
E cheia de sonho e vida
Repetia enfurecida:
Morrer, sim; nunca entregar-se.

Ao final dessa batalha
Jaz ali mortos no chão
Dezenas de quilombolas
Que lutavam, com razão
E amor, a todo custo,
Por um mundo humano, justo,
Sem sombras da escravidão.

Uns escravos conseguiram
Fugir pelos tabuleiros,
Porém, muitos deles foram
Já direto aos cativeiros...
Com Manoel Congo à frente
Outros líderes na corrente
Feitos são prisioneiros.

Não foi maior o massacre
Porque o seu fazendeiro
Perderia o seu escravo
Que lhe custou bom dinheiro;
Assim, o barão pensava,
Também, nisso acreditava
O império brasileiro.

Levados para Vassouras
Foram lá mesmo julgados,
Mas, somente Manoel Congo
Foi à morte condenado,
Pois, com seu idealismo
Se sentia o escravismo
Inseguro, ameaçado.

Dos dezesseis quilombolas
Listados pra julgamento
Foram dois absolvidos,
Tendo treze o sofrimento
De seiscentas e cinqüenta
Chibatadas violentas
Por dez dias de tormento.

Assim, em três de setembro
Do ano posterior
Foi Manoel Congo enforcado
Nas leis do dominador,
Daquele que, por vanglória,
Dita as leis, escreve a história
Na cartilha do opressor.

Porém, sempre que um mártir
Tomba às garras duma fera,
Toda história se transforma,
Se sucede a primavera,
De repente, num segundo,
Olhando bem, já o mundo
Não é o mesmo que era.

Só o fato que ele venha
A ser lido por alguém,
Conhecendo suas virtudes,
E os seus atos de bem;
Só pelo saber que fica,
Esse alguém, se modifica
E o mundo muda também.

Não adianta os martírios
Que impõe o dominador,
O mundo muda mais rápido
Nos sentimentos de dor...
Um dia, decerto, um dia
Há de surgir a utopia
Que Manoel Congo sonhou.



Memorial de Manuel Congo, construído no local                      onde ele foi enforcado. Vassouras, Rio de Janeiro.




Plano de aula - O escravo negro no Brasil

Plano de aula 
O escravo negro no Brasil 

1. Tema: O escravo negro no Brasil Colonial: tráfico e cotidiano. 

2. Objetivos: 2.1 Objetivo Geral: 
• Problematizar o conceito de escravidão durante os períodos colonial e imperial no Brasil.

 2.2 Objetivos específicos:
• Conhecer os diversos sujeitos históricos. 
• Analisar o cotidiano dos escravos negros nos ambientes urbano e rural, no que tange às atividades exercidas, os costumes, os castigos realizados contra eles e as resistências. 
• Identificar os fatos que levaram à abolição da escravatura. 

3. Conteúdos: • O que é ser escravo. 
• Trabalho escravo: período colonial e imperial. 
• As principais atividades exercidas pelos escravos negros nos ambientes urbano e rural. 
• Os costumes e os castigos. 
• Resistências. 
• Os Quilombos. 

4. Metodologia: 
“ Tudo quanto o homem diz ou escreve, tudo quanto fabrica, tudo em que toca pode e deve informar a seu respeito. ” A frase do historiador francês Marc Bloch (1886-1944) mostra como é ampla a noção de documento ou fonte para o ensino de História: filmes, músicas, charges, folhetos de cordel, jornais, livros... Diante da variedade de fontes que podem ser utilizadas nas aulas de História, pontuo a escolha de folhetos de cordel na discussão do conteúdo “ O escravo negro no Brasil Colonial e Imperial. Para lidar com a multiplicidade de linguagem à sua disposição, o professor precisa assumir uma postura interdisciplinar, com uso didático de diferentes suportes e inovação metodológica. Lembrando que esses diferentes suportes devem ser utilizados para atingir o aprendizado crítico do aluno em relação ao conteúdo proposto e não somente para complementar o que foi narrado no livro didático. A partir da leitura do conteúdo apresentado a aula seguirá da seguinte forma: 
• Num primeiro momento, para introdução da aula, será feita uma discussão sobre o conceito do que é ser escravo a partir do entendimento que os alunos têm em relação a esse termo. 
• Após a problematização inicial será tratado o conteúdo, através da projeção de slides, com o resumo dos tópicos elementares tratados no livro didático e apresentação do vídeo “ Escravidão no Brasil”.
 • Após essa fase, os alunos interpretarão o cordel de Medeiros Braga, O Quilombo de Manuel do Congo”, os alunos farão as considerações escritas e as considerações orais serão feitas no decorrer da aula. 
• Para concluir a aula, será solicitado aos alunos a produção de um cordel com a participação de todos os alunos e professor sobre a temática abordada. 

5. Recursos: 
• Projetor multimídia 
• Notebook 
• Livro didático 
• Folheto de cordel 

 6. Referências: 
SCHIMIDT. Mario Furley. Nova história crítica. Volume 2. São Paulo: Nova Geração, 1999. Obra em 4 volumes para alunos de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental. 
BOULOS JÚNIOR, Alfredo. História do Brasil; Colônia. Edição renovada. Volume 1. São Paulo; FTD, 1997. Ensino Médio. 
 FONSECA, Selva Guimarães. Didático e prática de ensino de História: experiências, reflexões e aprendizados. Campinas, SP. Papirus – 2013. 
 BRAGA, Medeiros. O Quilombo Manoel Congo: a saga de um guerreiro. Cordel. 2010. 

Texto de apoio: REPRESENTAÇÕES DA LUTA E DA RESISTÊNCIA NEGRA NO QUILOMBO MANOEL CONGO NA LITERATURA DE CORDEL

http://www.uel.br/pos/letras/terraroxa/g_pdf/vol21/TRvol21h.pdf REPRESENTAÇÕES DA LUTA E DA RESISTÊNCIA NEGRA NO QUILOMBO MANOEL CONGO ...